"Uma dose de amor próprio no social", por Carlos Henrique Musashi




Uma dose de amor próprio no social 


Por 

Carlos Henrique Musashi 



     “Antes de diagnosticar a si mesmo com depressão ou baixa autoestima, primeiro tenha certeza de que você não está, de fato, cercado por idiotas.” [SIGMUND FREUD]

 

Todos, em algum momento da vida, já ouviu falar que “é necessário coragem para encarar a vida”, mas é nas interações que desenvolvemos a coragem de enfrentá-la, onde achamos forças para não baixar a cabeça e reagir aos percalços quais possamos, independentemente da situação, vir a encarar. Não é novidade que lidar com o ser humano, fora de nossa zona de conforto (a família), pode ser complicado, ou muito prazeroso, no que depende muito das pessoas e lugares que escolhemos frequentar, mas principalmente da postura social que adotamos.

Às vezes, por “dever social” e/ou consideração a um relacionamento amoroso, afetivo, ou por necessidades profissionais, aceitamos certos convites que mais parecem uma coerção irresistível e acabamos por ir a certas atividades sociais que realmente não nos agradam e terminamos por nos arrepender, mesmo que tenhamos “nos comportado bem” e feito nossa parte no quesito social, mesmo entre aqueles indivíduos que mais parecem moscas varejeiras mapeando o ambiente e querendo migalhas de atenção daqueles que consideram “importantes” com aquele famoso repetitivo papo-furado, exibicionista, de autopromoção. Daquelas que só faltam sentar no nosso colo para ficarem mais perto de quem desejam ciosamente “interagir”, pois se levantarmos da mesa por alguns segundos, elas ocupam o nosso assento fazendo de conta que não existimos.

E isso pode acontecer nas idas e vindas, de nossas atividades sociais, esbarrarmos com alguns tipos de desagrados direcionados, percebemos que, por algum motivo e em determinados lugares, a nossa presença não está agradando a este ou aquele individuo e, por fim, somos alvos de um tratamento, vamos dizer, “diferenciado” reservado àquelas pessoas quais os petulantes e pernósticos acham que são indignas de merecerem o mesmo tratamento que as demais quais costumam bajular. E, por conseguinte, somos afetados por não sermos unânimes, pois o nosso desejo é sermos queridos e bem acolhidos aonde chegamos, mas, por algum motivo, o(s) “dono(s) da festa” não nos acolhera tão bem... No entanto, tudo que passamos nesta vida é para o nosso crescimento pessoal, mesmo as situações desagradáveis, pois se esta situação serviu de experiência é para o nosso o bem e não podemos chamar de problema, mas de uma oportunidade de amadurecimento – problema é aquilo que não tem jeito. E nossa forma de agir diante da menor adversidade é o testemunho da educação que recebemos.

Se isso ocorre de maneira recorrente em qualquer lugar aonde chegamos é recomendável avaliar a nossa postura e se os ambientes que escolhemos frequentar são adequados para nós. Mas se isso acontece de maneira recorrente em lugar específico, com o mesmo grupo de indivíduos, além do questionamento anterior devemos perceber se não estamos gerando de alguma forma algum desconforto seja pela nossa postura, seja por comentários que costumamos fazer, ou mais um caso de antipatia gratuita ou de simplesmente estarmos lidando com pessoas mal-educadas – que é o mais comum.

Caso isso aconteça de maneira mais grave, por conta de algum mal-entendido, e se for do nosso interesse solucionar tal questão pode-se recorrer ao diálogo ou, se for o caso, evitar voltar ao lugar onde não somos considerados como membro de determinado grupo, onde não estamos em pé de igualdade de tratamento com nosso semelhante, pois, como diria meu pai, pode ser apenas a questão de ter “vergonha na cara”, pois às vezes é algo que não tem solução por se tratar de um costume enraizado nos indivíduos de determinado grupo ou família. Então vale aquela velha frase a nos dizer que “os incomodados que se retirem” – e é o que faço, sem briga discursão e sem alvoroço, como quem da azeitona mastigada, à boca, se desfaz do caroço. Se não tem jeito e a minha presença se faz desnecessária “saiu à francesa”.

E em situações mais desconfortáveis, continuar indo a tal lugar, onde temos de fingir que não nos importamos com insultos ou provocações e, em silêncio, nos submeter a tratamentos “quase degradantes” só pra não demonstrar fraqueza aos expectadores, que consideram as palavras do provocador como “sinal de inteligência e perspicácia”; mas, mesmo diante da toxicidade de tal ambiente, permanecemos “firmes” diante das cruéis investidas; isso não quer dizer coragem. Na verdade, isso seria mais uma questão de medo de desagradar uma pessoa (ou grupo) por termos consideração a este ou aquele indivíduo. Mas esta consideração, qual dispensamos, não é recíproca, mas um “unilateral dever” de respeitar por estar, por exemplo, em casa alheia, seja por conta de parentesco ou por extensão de uma relação amorosa onde nos dizem “que somos da família” ou “quase um(a) filho(a)”.

Particularmente não me encanto facilmente com palavras, principalmente quando estas destoam das atitudes. Até porque as criaturas que, mesmo não tendo o mesmo sobrenome, mas “são consideradas da família”, no entanto, são colocadas abaixo de tal instituição, bem como estão sujeitas a levar a culpa até pela flatulência e outros maus hábitos dos membros deste grupo, pois vivem abaixo da “linha da razão”; são os cães, os gatos e outros semoventes. No entanto, se o referido bichinho for propriedade da “madame” este poderá ter acesso a certos luxos, “direitos” e prerrogativas familiares maiores que a maioria de nós “meros mortais”.

Só tem uma situação onde, talvez, suportasse tal tratamento por algum tempo, antes de entrar com um processo judicial – seria numa relação de emprego que eu precisasse muito, mas, em tempo hábil, deixaria claro o quanto foi má ideia mexer com meus direitos. E, a bem verdade, quando “aceitamos” tal tratamento, estamos enviando uma mensagem negativa a nosso respeito – de que não sabemos nos posicionar diante de tal situação, pois quando não nos posicionamos outros o farão por nós. Neste caso estaríamos aceitando o papel de “saco de pancada”, de “boneco”, de “brinquedo” de uma pessoa frustrada, possivelmente esnobe e insegura, transbordando o ácido da azia de seu viver em nós. E, por se sentir pessoa pequena, não de forma literal, mas por ser uma pessoa fraca, esta tenta se sentir “superior” à custa de alguém.

Quando, por exemplo, não nos posicionamos, seja diretamente com tal indivíduo ou por intermédio de alguém de maior discernimento que este, aquelas “brincadeiras” de mau gosto, diante do nosso silêncio, podem evoluir para insinuações desarrazoadas e reiteradas que, por sua vez, podem se transformar em afirmações bem mais desagradáveis.

Assim como Joe Louis Clarck[1] acredito que “o respeito próprio deve permear cada parte de nossa vida” e nos submeter tais situações desagradáveis de forma ignomínia é uma afronta a este princípio, mas isto também se aplica àquele que não respeita, pois, o respeito próprio faz com que consequentemente respeitemos outras pessoas. No entanto, suportar tal situação de maneira sábia, munidos da misericórdia divina, entendendo de coração que tal pessoa agressiva não está bem, que suas ações decorrem de um problema alheio ao nosso entendimento isso é sinal de evolução pessoal, pois entendemos que tal individuo tem um problema – não nós, assim seremos capazes de perdoar instantaneamente munidos da compaixão sem os estigmas da superioridade moral.

E quando agimos de forma diversa de tal princípio também enviamos uma mensagem negativa sobre nós mesmos, abrindo precedentes para uma “reação” em nosso desfavor que pode vir através de uma resposta grosseira, uma agressão física ou até mesmo, dependendo da gravidade de nossas palavras, uma ação judicial seja por injúria, calúnia ou difamação – entendamos com isso que a liberdade de expressão tem limites. Não é apenas “município que tem limites”, tudo tem seu limite, salvo o amor de Cristo...

Sabendo que nossa paciência é finita, em dados momentos é melhor nos abster de darmos aquela resposta a certos insultos e provocações, não devemos agir por impulso para não se arrepender depois.

O assediador é um covarde em sua essência, pois só importuna quando se sente em suposta vantagem, mesmo que seja apenas pelo fato de “estar em casa” diante dos seus. E, como sabemos, todo covarde é oportunista, mas, reagir a este, somente de maneira educada, na medida de nosso bom senso e direito é uma questão de princípios, lembrando que “não devemos responder ao insensato com igual insensatez, do contrário iremos nos igualar a ele”[2]. Mas, percebendo que sua paciência não dará conte de tal situação é melhor sair de perto.

Algumas pessoas se sentem intimidadas com a condição social de outros indivíduos “mais abastados”, pois temos a mania de superestimar pessoas “bem vestidas”, “pessoas viajadas” e cheias de orgulho por cada graduação, isso é importante, mas não adianta muito se o que vem de berço é a tendência ao puxassaquismo e a falta de civil noção – aquelas que conhecemos, também, como esnobes, esta imitação barata de socialite, que geralmente faz parte da classe média, “tão longe de ser rica e tão perto de ser pobre, mas é incapaz de se enxergar”, no entanto, sentem prazer em intimidar pessoas mais “humildes” que, de algum forma (seja por preconceito, inveja, ameaça putativa) lhes chamou a atenção; mas são inofensivas, desde que ignoradas, pois são tão fracas quanto vazias e inseguras, embora tentem de forma itinerante e desesperada convencer do contrário, mas tem gente que as teme.

Todos têm algum tipo de medo, receio, nas interações sociais, seja de cometer uma gafe, de ser mal interpretado, de não ser aceito, de ter sua reputação manchada ou qualquer outro. Este receio acomete principalmente com os esnobes, pois do contrário não teriam que ficar segurando suas “máscaras de seres superiores” referente à superioridade qual tentam ostentar, mas de fato não possuem.

No caso meu caso, hoje, sentir medo é treino de superação. Mas o maior de meus medos ainda é de mim mesmo, pois sou eu quem abre as portas aos sentimentos e respetivas reações de uma fera impiedosa e criativa, que reside dentro de mim, qual prefiro manter bem trancada, por isso, antes de chegar no meu limite, prefiro me retirar – já esbarrei com alguns babacas que só não levaram a pior por conta de minha educação e pelo meu talento em ignorá-los.

Vale salientar que existe uma fronteira muito tênue entre o egoísmo e o amor-próprio. Existe um perigo inerente de confundirmos facilmente este o nosso solipsismo[3] com o "saudável respeito que temos por nós mesmos". Isso nos outros, porque, em nós, não enxergamos nada de errado.

Daí a necessidade de nos perguntarmos freudianamente “Qual a nossa responsabilidade na desordem da qual nós nos queixamos?”

Confesso que tem sido uma pergunta que venho me fazendo, pois atribuir aos outros toda a culpa é muito fácil e cômodo para fugir de minha parcela de responsabilidade. E, despois de indagar-me, confesso que muitas das coisas do passado que até hoje me queixo, por terem sido experiências bem amargas e traumatizantes, teve um final assim por minha falta de humildade ao lidar com tais situações, pelo meu orgulho em querer “dar uma resposta a altura” àqueles que me ofenderam de forma tão “escrota” e agir por impulso mostrando “minha maior força e ilusória superioridade”, terminando agindo por impulso, saindo de mim, perdendo minha razão, me igualando em tolice e me arrependendo depois, pois eu “não queria ficar por baixo”, mas acabei ficando bem raso, pois estava preocupado com o que vinha de fora, agindo como um ser vaidoso, arrogante, tolo e superficial. E não estou falando de violência física, pois não sou dado a tal tipo de violência, mas foram as minhas palavras que agravaram tais situação e deram suporte a pessoas já experimentadas na maldade a agirem com a canalhice maior do que aquela empregada no início de suas más ações. Como alguém já disse: “quem muito está preocupado com que está fora está dormindo, quem entra em si está iluminado”.

Tudo teria se resolveria se eu apenas tivesse me afastado quando tive a chance. E, ao em vez de “responder a altura” eu tivesse procurado me acalmar, me apegado aos bons princípios e, só depois, de maneira sensata ter procurado os meios legais para resolver tal situação. Mas é incrível o quanto a raiva pode nos deixar cegos e surdos quando estamos sujeitos ao nosso ego ferido, chegando ao contraditório ponto de fazer o pior para mostrar que somos melhores, principalmente quando estamos sozinhos em uma situação em que não damos ouvidos a voz da experiência de quem tenta de fato nos acalmar – nos ajudar, a nos dizer, depois de nos servir um copo d’água – “meu filho, respire!”

Resumindo… Em qualquer grupo (seja família, clube, partido e etc.) onde “se escolhe a quem irão respeitar”, existem muitas maneiras de um anfitrião e seus respectivos associados “expulsarem” um visitante: uma delas é, mediante o doloso cinismo, deixar "claro" por atitudes e insinuações variadas o quanto a presença deste(a) é passiva de tratamento desrespeitoso, ignominio, de forma reiterada.

A porta já está aberta, possivelmente não irão diretamente mandá-lo se retirar, mas a deixa foi dada, mas é o respeito próprio que move as pernas de tal visita em direção à saída para, talvez, nunca mais voltar. No entanto, devemos evitar o orgulho, este sentimento baixo que nos faz desejar machucar outras pessoas, sendo cruel quando nos divertimos com tal vingança.

Para reagir a certas situações não precisamos de violência, nem de palavras de baixo calão e nem mesmo sair atirando farpas em retaliação a uma pessoa mal-educada, até porque não estaríamos sendo melhores do que esta. Apenas precisamos de uma dose de amor próprio, de reconhecer que certos ambientes não são para nós, pois temos lugares melhores para frequentar, dignos de nossa presença, não por uma questão de arrogância, mas pelo saudável respeito que temos por nós mesmos.

Devemos ter cuidado com o veneno chamado mágoa. Às vezes, quem nos magoou, pode mudar de ideia diante de nossa postura de simplesmente não tê-la confrontado, pois, diante de sua investida simplesmente não a confrontamos por não ter nada de bom a ser dito em tal momento e, acredite, o silêncio diante de quem tenta ofender pode doer bem mais do que a melhor retórica.

E nada nos impede de aceitar desculpas pelo ocorrido, se estas “desculpas” forem apresentadas – raro em ambientes supremacistas[4], mas se dadas e aceitas, estas desculpas, não nos vincula a continuar frequentando tal ambiente e nem muito menos de guardar rancor ou de dar outra chance.

Assim como a maioria dos viventes aprecio bastante a vida social, bem como aprecio muito uma boa bebida ao lado de boas companhias, fazer novas amigos, enriquecer e fortalecer a minha network[5] bem como todas as coisas positivas que uma vida social pode proporcionar. No entanto, desde que me entendo por gente, costumo escolher os lugares que frequento, sem afetação e preconceitos, mas quando percebo que meu lugar não é aquele me lembro de uma frase que minha mãe costuma repetir desde minha infância: “boa romaria faz quem em sua casa está em paz”.

[1] Ex-diretor que revolucionou o ensino de uma “escola bem problemática”, a Eastside High School, em Nova Jersey/EUA. Foi tema do filme “Meu mestre, minha vida”  (“Lean on Me”, 1989), estrelado por Morgan Freeman.

[2] Provérbios 26:4 – Antigo Testamento bíblico.

[3] Concepção filosófica de que, além de nós, só existem as nossas experiências. O solipsismo é a consequência extrema de se acreditar que o conhecimento deve estar fundado em estados de experiência interiores e pessoais, não se conseguindo estabelecer uma relação direta entre esses estados e o conhecimento objetivo de algo para além deles. O "solipsismo do momento presente" estende este ceticismo aos nossos próprios estados passados, de tal modo que tudo o que resta é o eu presente.

[4] Que ou quem é adepto do supremacismo ou de ideologia que defende a supremacia ou superioridade de um determinado grupo de indivíduos e que reclama para os seus membros o domínio dos restantes indivíduos. "supremacista", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [on-line], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/supremacista [consultado em 09-09-2020].

[5] Network é uma “rede de pessoas” (ou “rede de contatos”) que trocam informações, experiências e conhecimento entre si, gerando benefícios para todos os envolvidos.

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