COGNIÇÃO SOCIAL E HABILIDADES SOCIAIS NO AUTISMO: UM DESAFIO PARA PROFISSIONAIS DA SAÚDE (#artigo)
Por Carlos Henrique Musashi, em 26/04/2024
Como
Autor, Especialista em Direito Educacional e recente Pesquisador no campo do
autismo, acredito na relevância em abordar a intricada relação entre cognição social e habilidades sociais, especialmente no contexto da avaliação e
intervenção adequadas para indivíduos autistas. Muitos profissionais de saúde
ainda enfrentam desafios ao diferenciar esses dois aspectos cruciais na
experiência dos autistas, o que pode levar a diagnósticos imprecisos e falta de
intervenções adequadas.
Cognição Social: A Percepção do Contexto Social
A
cognição social refere-se ao conjunto de capacidades
cognitivas[1] que nos permitem
perceber, interpretar e responder adequadamente ao contexto social. Isso inclui
a compreensão de nuances sociais, expressões faciais, linguagem corporal,
intenções dos outros e dinâmicas sociais.
Indivíduos
autistas frequentemente apresentam déficits na cognição social, o que pode
afetar significativamente sua interação interpessoal, compreensão de emoções
alheias e habilidades de comunicação.
Habilidades Sociais: A Adaptação Prática ao Social
Por
outro lado, as habilidades sociais são sabedorias práticas que adquirimos ao
longo da vida sobre “como agir e interagir” em diferentes situações sociais.
Isso engloba a capacidade de iniciar e manter conversas, interpretar e
expressar emoções, resolver conflitos de forma construtiva e adaptar-se a
contextos sociais variados. Mesmo que um indivíduo autista apresente déficits
na cognição social, ele pode desenvolver habilidades sociais por meio de
treinamento, prática e intervenções específicas.
Masking: A Estratégia de Adaptação dos Autistas
O
"masking" é uma estratégia comum entre autistas, especialmente
aqueles de nível 1 de assistência, onde há uma adaptação mais sutil. Consiste
em camuflar ou disfarçar suas dificuldades sociais, imitando comportamentos
considerados "normais" pela sociedade neurotípica. Isso pode incluir
a imitação de expressões faciais, controle do tom de voz, uso de scripts
sociais e outros mecanismos para se ajustar ao ambiente social. No entanto,
esse processo pode ser exaustivo e levar a um desgaste emocional significativo
devido ao esforço constante para parecer neurotípico.
Desafios para os Profissionais da Saúde
Os
profissionais da saúde enfrentam o desafio de não se deixarem enganar pelas
habilidades sociais aparentes de autistas que utilizam o masking. É fundamental
que eles sejam treinados para identificar não apenas as habilidades sociais
manifestas, mas também os déficits na cognição social subjacentes. Isso requer
um entendimento profundo dos espectros de apresentação do autismo, incluindo
suas variações individuais e estratégias de adaptação como o masking.
Educação e Sensibilidade Profissional
Para
garantir uma abordagem mais sensível e eficaz no atendimento aos autistas, é
essencial investir em educação continuada e sensibilização dos profissionais da
saúde. Isso envolve:
1.
Treinamento Específico:
Capacitar profissionais para observar e identificar sutis déficits na cognição
social, mesmo em autistas que utilizam o masking.
2.
Conhecimento Ampliado:
Compreender as diferentes manifestações do autismo, incluindo o masking e
outras estratégias de adaptação.
3.
Avaliação Holística:
Utilizar ferramentas e testes específicos para avaliar não apenas as
habilidades sociais visíveis, mas também a cognição social subjacente.
Conclusão: Rumo a uma Abordagem Inclusiva e
Eficiente
Ao
explorarmos a intrincada relação entre cognição social e habilidades sociais no
autismo, estamos não apenas desvendando uma complexidade científica, mas também
abrindo caminho para intervenções mais precisas, suporte adequado e uma vida
autêntica para os indivíduos autistas. No entanto, para alcançar essa meta, é de
suma importância reconhecer e abordar os desafios enfrentados na prática
clínica e social.
É
lamentável que muitos autistas tenham que lidar com profissionais de saúde que
não estão devidamente capacitados para compreender a diversidade
neurocognitiva. A falta de sensibilidade e conhecimento específico pode
resultar em diagnósticos imprecisos, intervenções inadequadas e até mesmo
perpetuação de estigmas e preconceitos. A vivência de autistas que se deparam
com psiquiatras capacitistas, por exemplo, é um reflexo dessas lacunas na
formação e prática profissional.
É
imperativo investir em programas educacionais contínuos para profissionais da
saúde, especialmente aqueles que lidam diretamente com o diagnóstico e
tratamento de autistas. Esses programas devem abranger não apenas os aspectos
técnicos do autismo, mas também a sensibilização para as experiências e
desafios enfrentados pelos autistas, incluindo o masking e outras estratégias
de adaptação.
A
valorização da experiência autista é fundamental para uma abordagem inclusiva e
eficiente. Os profissionais de saúde precisam reconhecer e respeitar o
conhecimento e a vivência dos autistas sobre sua própria neurodivergência. Um
diagnóstico "feijão com arroz", baseado em estereótipos ou falta de
aprofundamento, não apenas prejudica a qualidade do atendimento, mas também
mina a confiança e autoestima dos autistas.
Ao
capacitarmos os profissionais da saúde e promovermos uma compreensão mais
profunda do autismo na sociedade, estamos contribuindo não apenas para o
bem-estar individual dos autistas, mas também para a construção de uma
sociedade verdadeiramente inclusiva e respeitosa com a diversidade
neurocognitiva. É necessário um esforço coletivo para superar estigmas, ampliar
o acesso a serviços adequados e criar ambientes que valorizem a neurodiversidade[2] em sua plenitude.
Essa
jornada de conhecimento e conscientização é contínua e dinâmica, exigindo o
engajamento de todos os setores da sociedade para alcançarmos um futuro onde
todos os indivíduos, independentemente de sua neurodivergência, possam viver
com dignidade, respeito e oportunidades equitativas.
Carlos Henrique Musashi
Autor, Bel. em Direito, Especialista em Direito Educacional, Perito Judicial em Cálculos Trabalhistas
[1]
As capacidades cognitivas referem-se às diferentes habilidades mentais que uma
pessoa possui para processar informações, compreender o ambiente ao seu redor,
aprender, lembrar, resolver problemas e tomar decisões. Isso inclui habilidades
como atenção, memória, linguagem, raciocínio, compreensão de conceitos
abstratos, tomada de decisões e resolução de problemas. No contexto do autismo
e da cognição social, as capacidades cognitivas são importantes para entender
como as pessoas percebem, interpretam e respondem às interações sociais e aos
estímulos do ambiente social. Reconhecer e compreender as capacidades
cognitivas de um indivíduo autista é fundamental para proporcionar intervenções
adequadas e promover seu desenvolvimento de forma significativa.
[2]
Neurodiversidade é um termo que destaca a variedade natural e saudável de
funcionamento cerebral dentro da população. Isso significa que as pessoas têm
diferentes maneiras de pensar, processar informações, interagir e se comportar,
e essa diversidade é parte normal da condição humana. No contexto do autismo, a
neurodiversidade reconhece que ser neurodivergente, como ser autista, não é uma
condição patológica a ser corrigida, mas sim uma forma legítima de existir no
mundo, com suas próprias habilidades, desafios e perspectivas únicas. Portanto,
promover a neurodiversidade envolve respeitar e valorizar as diferentes formas
de funcionamento cerebral, buscando ambientes e práticas inclusivas que atendam
às necessidades e potenciais de todas as pessoas, independentemente de sua
neurodivergência.
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