REGRAS NO “DESGOSTAR”

 


Regras no “desgostar”

Por Carlos Henrique Musashi, em outubro de 2020

  

Cada indivíduo é regido por um conjunto intrincado de normas, mesmo aqueles que as repudiam ou negam. Mesmo quando afirmam seguir a máxima de "não ter regras", essa afirmação, por si só, constitui uma regra implícita. No âmbito psicológico, a teoria de Freud destaca a presença fundamental do Superego[1], Id[2] e Ego[3] na formação da personalidade.

O Superego representa a parte da mente que internaliza normas sociais e padrões éticos, agindo como o juiz interno. Juntamente com o Id, a parte instintiva e imediata do psiquismo, e o Ego, responsável por equilibrar impulsos e realidade, essas instâncias psíquicas moldam nossa conduta.

Dessa forma, a inerência em criar nossas próprias regras pessoais resulta da interação dinâmica entre esses elementos da psique. O entendimento dessas estruturas psicológicas não apenas revela a complexidade da mente humana, mas também oferece insights sobre como desenvolvemos padrões de comportamento e normas pessoais.

Particularmente tenho muitas regras pessoais, até no ato de “desgostar de alguém”, pois como sabemos, relacionamentos vão e vêm, principalmente no tocante aos relacionamentos amorosos, que são mais comuns de se desfazerem. Mas no geral , quando uma relação se acaba, seja ela amorosa, profissional ou simples amizade, geralmente estes “fins de relação” deixam algum ranço, uma mágoa e muitas vezes um “sabor de revanche."

Certa vez, conversando sobre este assunto com alguém eu disse que, quando desgosto de uma pessoa e a amizade acaba, juntamente com toda confiança e admiração que outrora sentia “eu passo a respeitá-la tal pessoa como respeito a qualquer um que passa na rua”, seja esta quem for ou que pense que é.

— Mas como seria esse lance de “respeitar como qualquer um que passa na rua”?

Aí é que está. Cada um tem seu jeito de ligar os transeuntes de sua vida. E o meu jeito de lidar é assim: embora não seja mais “seu amigo”, por exemplo, com quem tinha certas liberdades, regadas pela confiança e a admiração, mas isso não quer dizer que serei seu inimigo. Essa história de “se não for amigo tem que ser inimigo” soa muita como um exagero fatalista. Se não existe mais nada, mas se nos conhecemos, então seremos meros conhecidos. Responderei a sua saudação (de bom dia, boa tarde ou boa noite), respeitarei o seu espaço, procurarei não falar mal de você e nem levarei adiante fofocas sobre sua pessoa, de nenhuma forma tentarei contra sua honra e, se um dia alguém imputar algo a você que eu sei que não é verdade, pode ter certeza que, eu o defenderei. E tratarei assuntos alheios a mim como faria com qualquer assunto que “não seja de minha conta” assim os classificando categoricamente dizendo:

— Isso não é de minha conta!             

E se um dia, o não mais amigo, aquele(a) que quebrou os laços sagrados da confiança, ou a “ex”, vierem a minha porta, seja por questão de necessidade e/ou justiça, eu os receberei. Não mais com o “conforto das palavras” da George Eliot[4], mas apenas guiado pela educação e pelos meus princípios. E, garanto, isso será suficiente diante da possibilidade de um diálogo civilizado, mesmo que eu esteja com um pé atrás e precise de uma terceira pessoa, como testemunha, para acompanhar tal conversa.    

Estou longe de ser um santo, de ser um paradigma, e nem tenho tal pretensão, mas como temente das leis do Universo, principalmente aquela do “retorno”. Estou longe de ser falso e sonso, mas apenas procedo, com os outros, da forma que gostaria que agissem se estivessem em meu lugar e principalmente gosto de deixar os outros em paz. E assim procedo, pois já senti o sabor da maldade dos litigantes de má fé, dos desocupados, dos mendigadores de atenção e de aprovação alheia, que usam de meias palavras para disseminar o mal, sempre com um “mas” na ponta da língua, prontos para macular, sem necessidade, a reputação de alguém, com o fito de melhorarem ou manterem as suas reputações erguidas sobre o alicerce do dolo oriundo de um péssimo caráter. Se bem que conheço gente que faz isso, sentado à mesa, com outros desocupados, apenas como passatempo.

E, embora não possa me dizer cristão, que não seja apenas por batismo, mas sigo aquela premissa que diz: “assim, em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles façam a vocês”[5]. Simples assim…



[1]  O Superego é como a voz interior que representa nossa consciência. Ele é influenciado por normas sociais, éticas e morais que aprendemos ao longo da vida. Pode ser comparado a um guia interno que nos diz o que é certo e errado.

[2] O Id é a parte instintiva e impulsiva da mente. É a fonte de desejos básicos e instintos primitivos, buscando satisfação imediata sem considerar as consequências. O Id opera no nível subconsciente e é guiado pelo princípio do prazer.

[3] O Ego age como o equilíbrio entre o Superego e o Id. Ele busca satisfazer os desejos do Id de maneira realista e socialmente aceitável. O Ego leva em conta a realidade e considera as consequências, buscando um equilíbrio entre as demandas do Id e as expectativas do Superego.

[4] Alusão à famosa frase da referida romancista britânica, cujo o nome verdadeiro é Mary Ann Evans, que escreveu: "A amizade é o conforto indescritível de nos sentirmos seguros com uma pessoa, sem ser preciso pesar o que se pensa nem medir o que se diz”.

[5] Evangelho de São Mateus 7: 12.




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